Geralmente, quando estou muito cansada e me sento por alguns minutos em
frente a uma janela iluminada, fecho os olhos, e imagino morar em uma rua de
casas construídas com tijolos à vista, rodeadas por jardins coloridos. Para
cada casa há uma janela generosa, emoldurada com esquadrias de madeira, e uma
varanda nos mesmos tons de marrom, completando o bucolismo da cena.
Ora, vejam... Essa rua
não é a rua da minha casa, o que não quer dizer que a rua da minha casa seja
melhor ou pior do que aquela. A rua onde moro, por dezenas de razões, é muito
peculiar, a começar pelo nome que é nome de uma cidade - Uruguaiana- onde, por
sinal, nunca estive.
E que interessante uma rua
com complexo de cidade (e será que não o é?)
Aqui - e talvez somente aqui - existe
uma árvore sonora, não por acaso localizada em frente à padaria. Por volta das
cinco horas da tarde, os pássaros das ruas adjacentes se recolhem todos para lá
e ficam a trocar experiências acumuladas do dia que se finda. Imagino como a
vida de um pássaro da cidade deva ser agitada, a julgar pela algazarra do
“happy hour” da passarada. Se alguém um dia lhe perguntar sobre um point quente
na Uruguaiana, aponte para aquela árvore e responda: ”É logo ali!”
Sim... Já sei que sentirei saudade
daqueles pássaros. E do alvoroço que eles fazem ao final das tardes.
Outra característica dessa rua são as
guias das calçadas, todas tão altas que, por várias vezes, já tive medo de
torcer o pé. Pior, medo de derrubar o bebê de dentro do carrinho. É possível
que algum forasteiro, ao caminhar por esses passeios altivos, suponha não haver
deficientes físicos residentes na Rua Uruguaiana, o que seria ledo engano de se
pensar, já que residem e resistem bravamente.
E para completar, poderia
citar tantas outras curiosidades típicas desse logradouro, mas decidi focar o
fechamento desse texto num edifício especial, que por pouco não escapa da Rua
Uruguaiana para a Rua Barão de Jaguara: o colégio que ocupa a esquina em frente
ao prédio de número 399.
Seis anos vividos no mesmo
endereço, e apenas seis meses dentro desse colégio. Sentirei saudades, embora
não tenha sido eu a aluna daquela professora dedicada, e nem tenha sido eu a
cruzar esbaforida por aqueles pátios, ou a compartilhar do momento de lanche
com os colegas da classe. Mas, creiam, é como se tivesse sido. Cheguei a essa
altura da vida para perceber que a infância da gente acontece uma vez apenas,
para que tenhamos gosto em acompanhar a infância dos filhos que Deus nos dá;
sejam os filhos de sangue, sejam os filhos de coração.
E já que toda despedida tende a
ser triste, melhor não colocar ponto final nesse texto e chamá-lo apenas de
capítulo.Por conseguinte, esse será o primeiro.
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