Se até o final da vida eu não publicar um livro, darei-me por contente se bordar uma colcha de retalhos. Escritores e artesãos tem muito em comum, uma vez que dedicam seus dias e noites à tênue tarefa de alinhavar cada qual a sua matéria
prima. No caso do escritor, faz o casamento das palavras com o papel, ainda que
em uma tela de computador. Já o artesão faz a emenda dos retalhos e reconstrói
a vida do próprio tecido.
Por isso que me contentaria e muito, ficar somente na colcha de
retalhos, pois, afinal, que são estórias se não um apanhado de fragmentos que
sobram da confecção de extensas vivências? E aparas não merecem desprezo só
porque não participaram da peça de roupa. Que esperem silenciosas por seus
pares quando, enfim, contínuas, terão voz para narrar o enredo por detrás de
suas estampas.
Ninguém
escreve ou borda sem a catálise do suor e das idéias. Imagino os dedos
picotados do artesão, e deles fluindo gotículas mornas de sangue. E os dedos do
escritor, recortados por palavras afiadas que fluem esporádicas como gotículas
de sangue. No fim das contas, ambos concordariam, o retalho é que dará corpo ao
efeito uníssono de suas obras.
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